Vivemos tempos conturbados em vários sectores da sociedade, senão em todos. Há quem diga que as mudanças geram reactivamente contestação, pois faz parte da natureza do ser humano, em especial do povo português que gosta de estar no seu cantinho sem que o incomodem.
Assistimos a uma onda de manifestações, das quais particularizo a do grupo profissional dos professores dos níveis de ensino pré-escolar, básico e secundário.
Mas, independentemente, de quaisquer considerações acerca das medidas tomadas pelo Ministério da Educação, torna-se emergente reflectir sobre o movimento que corre o país de lés a lés, excepção feita às Regiões Autónomas, onde o sistema de avaliação é pacífico, nomeadamente nos Açores, que foi pensado com instituições de ensino superior credíveis, como prova a análise das fichas de avaliação que simplificam o processo e o tornam evidentemente mais objectivo.
É incontornável, dizia eu, falar desta mobilização autêntica, espontânea, genuína dos professores, embora os mais desprevenidos e dogmáticos continuem a rotulá-la de político-partidária e defendam que, afinal, não passam de manobras urdidas pelos vários partidos os quais, a propósito de não sei o quê, se uniram contra a política do Ministério da Educação.
Considero que esta fachada que alguns tentam impor para fazer crer que os professores não passam de meros fantoches nas mãos de dirigentes sindicais, partidários ou outros, se venha a revelar até perigosa.
Baseio esta minha percepção na imprevisibilidade que esta mobilização geral pode originar, já que, de facto, é a indignação de uma classe que tem vindo a ser denegrida desde há alguns anos, quer pelos efeitos do desgaste das sistemáticas reformas que aconteceram continuamente, em prol da melhoria do sistema educativo e que se revelaram catastróficas, quer pelo contributo que os governantes têm dado ultimamente para transformar os 150 mil professores deste país numa classe de incompetentes e faltosos. Esta generalização acabou por afectar a dignidade daqueles que, de facto, sempre foram dedicados à profissão e nunca precisaram de diplomas legais para compreender que o essencial do seu trabalho são os alunos!
Esta tomada de consciência global que, por sua vez, está a gerar também uma acção global, será certamente para os sociólogos um campo interessante para aprofundar.
A apatia da maior parte dos docentes durante anos e anos, que as forças sindicais não souberam contrariar, está a dar lugar a uma tomada de atitude consciente, embora haja sempre quem o exprima menos bem, talvez devido à falta de hábito das luzes da ribalta.
Se pensarmos que a escola é uma área onde se concentram o maior número de licenciados por metro quadrado, como dizia há tempos um responsável do sector, e constitui um dos maiores grupos profissionais dotados de um grau académico superior, então teremos razões sérias para ficarmos apreensivos com esta mobilização a nível nacional. Afinal, os ministros passam e eles permanecem...
Interessante o texto do A VER O MUNDO
Irene Ermida