28/05/2007

transparência(s) 1

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retoco o olhar com sombra azul

revejo-me no espelho por breves segundos

saio e vagueio por jardins diáfanos que me embelezam os sentidos

apanho o feixe de luz que incide na sombra de mim

vestida de transparências rústicas e prescritas

nego singularidades deturpadas de flores silvestres

porque de selvagens respiram

mergulho em lagos gelados que fortificam excentricidades ocultas de peixes rosados

porque de rosas se alimentam

beijo pássaros que persistem distantes das luas e dos sóis

sorrio aragens de satisfação genuína de fontes de águas castas

porque ninguém alcança

regresso impregnada de tranquilidades visíveis
retoco o olhar com sombra azul

revejo-me no espelho por breves segundos

e prossigo - incansável, consistente e sólida

20/05/2007

romaria popular q.b.


«Como está a tua agenda? Tás para me aturar?» Foi esta mensagem via telemóvel que o meu amigo recebeu. E estava. Como estão sempre os verdadeiros amigos!
Um jantar rápido enquanto fizemos o ponto da situação das nossas vidas: novidades de cá e de lá; a dele mais organizada e tranquila; a minha com as necessárias flutuações para quebrar rotinas indesejáveis.
O passeio a pé que encetámos em seguida à beira-mar, fazia prever uma deambulação ao sabor de ideias e de sentimentos... cinema, teatro, política, amores e desamores, filhos, casamentos, divórcios... e demos connosco no meio do Senhor de Matosinhos.
Há anos que não sentia o odor das farturas que teimam em acoplar-se aos churros de nuestros hermanos; o algodão doce branco ou cor-de-rosa que girava e crescia, e fazia crescer água na boca; os divertimentos que agora, além de todos os que povoaram a minha/nossa infância, já incluem motos todo o terreno ou as chamadas motos quatro, que fazem as delícias de quem nunca terá coragem para vender os electrodomésticos e comprar uma.
Descobrimos que fazer o «enxoval» pode ser animador para quem quer juntar os trapinhos, pois, por cinco euros vendem dez peças de loiça; a olaria regional contrastava com a «porcelana» fina da Vista Alegre desenhada por Fátima Lopes; a cestaria que evoluiu de design e de funcionalidade desde o tempo em que os meus pais me levavam aos Remédios; pedras vindas do Brasil ao lado das peças de roupa vindas do Peru, ao lado de instrumentos artesanais de música que nos abrem o apetite de viajar até à cordilheira dos Andes; os relógios que atraem os coleccionadores e as bugigangas sonoras e coloridas que seduzem as crianças; as esculturas africanas que, em menor número este ano, denotando a política de imigração, passavam despercebidas junto ao alarido das «discotecas» que passavam os top ten da popular música portuguesa que, agora, nem sabemos muito bem o que é.
Um quadro de cor, de luz, de movimento, de odores, de multidões, que me fez recuar até à minha infância e levar-me a desafiar o meu amigo a dar uma volta numa das distracções que me faziam sonhar aos dez anos. Mas a sua expressão de surpresa convenceu-me a desistir antes que me pedissem o B.I.
Optámos por acabar a noite numa cervejaria que se orgulha de ter um leque variado de cerveja e, entre duas imperiais e tremoços, alguns desabafos e conselhos que têm o dom de me ancorarem e deslindar alguns nós que vão entorpecendo a existência.


ócios produtivos (?)

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«Porque será que estamos condenados a ser assim tão solitários? Qual a razão de tudo isto? Há tanta, tanta gente neste mundo, todos à espera de qualquer coisa uns dos outros, e, contudo, todos irremediavelmente afastados. Porquê? Continuará a Terra a girar unicamente para alimentar a solidão dos homens?»


Sentada, ao fim da tarde, num bar de praia tentava concluir um dos livros que me acompanham há algum tempo «Sputnik, meu Amor», de Haruki Murakami.
Interrompia a leitura pontualmente para observar o movimento da palhinha que, num copo vazio abandonado numa mesa à frente, interpretava uma dança sensual com o vento, que a acariciava com a delicadeza de um amante terno e apaixonado.
O olhar projectava-se no horizonte dominado pela espuma das ondas cúmplices que, em movimentos despudorados, mostravam ao vento que o mar enrola na areia.
Tropecei subitamente nas palavras! Não naquelas proferidas pelo homem que se levantou para ver o resultado do jogo: «viva o Mourinho»; «o Mourinho é o maior!»
E divaguei... solidão... solitários... o ser humano é essencialmente social...
Há momentos em que, sozinhos, não nos sentimos solitários e vice-versa. A solidão é necessária e, sem dúvida, tem efeitos terapêuticos; é ela que nos permite dissecar o que se passa à nossa volta e no nosso interior. É ela que nos mantém conectados ao exterior, aos outros, ao mundo. É ela que nos mantém em sintonia e harmonia. Quando bem orientada, pode traduzir-se no encontro com o outro e descobrir o valor e o significado que o outro tem para nós.
Agora, um solitário que se agrupe com outro solitário... resultará em dois solitários ou não necessariamente?!


das sombras à clareza

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http://prismes.free.fr/myst.htm

e os contornos que me medem redefinem-se
numa silhueta contrastante de luz e de cor
esbatem-se as sombras
nas águas subitamente tranquilas
e a nitidez da imagem
corporiza vontades e rumos
numa determinação lúcida
de desvendar o que esqueci

esqueci-me,
entre medos e tempestades
desviei-me,
entre muros e espectros

mais forte que o vento
dás-me força
olhares e palavras
despertam-me
e sinto-te

18/05/2007

de sombras

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http://prismes.free.fr/myst.htm


imito o som da ave que, frenética, enceta um voo delirante
esbarro no remoto muro de solidez e opacidade
mãos revoltas tão vazias e cheias de tudo

rebelo-me contra vagas de saudades que povoam recantos ocultos
tropeço na lágrima obstinada reflectida no espelho
embaciada na solidão que deixaste

um mundo de sombras coexiste
de mim de ti
p'ra nós

13/05/2007

Um pé de dança

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Foto: 1000imagens

Uma destas noites tive uma curiosa experiência. Entrei e senti que recuara umas décadas.
A música variava entre melodias sentimentalóides do tempo da minha adolescência e um ou outro ritmo mais actual.
Fui observando: pessoas de meia idade acompanhadas de outras de metade da idade delas, um outro casalinho mais jovem, alguns solitários… Pairava um clima de insinuação, de desejo, de vontades
Subliminarmente, o desespero andava à solta: vestidos justos que agitavam corpos que, um dia, já foram perfeitos; decotes ousados que alimentavam esperanças; camisas cujas fraldas tentavam esconder o peso da idade; olhares de caçadores furtivos à espera da distracção da presa; gestos sedentos do amor que nunca chega.
Estoicamente, teimam em manter-se vivas apesar das marcas deixadas pelo tempo inexorável, que lhes semeou desgostos e desilusões, e que os impele a viver na urgência do momento, antes que notícias súbitas de doença ou morte lhes venha cortar a conexão a esta existência efémera.
Deambulei pela realidade deprimente e a reflexão incontornável. Há vivências que têm o efeito terapêutico de nos acordar do entorpecimento mental, em que a rotina nos vai envolvendo.
Quantas vezes nos deixamos subjugar pelas circunstâncias e nos obrigamos a vegetar durante o ciclo noite-dia, evitando o confronto connosco próprios?
NOTA: Este texto foi escrito três vezes! A ligação caiu e perdi-o das duas primeiras vezes. O primeiro estava muito mais incisivo... Aprendi a lição: escrevo em Word e colo em seguida!

10/05/2007

interrogações que tiram o sono...

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???

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??? em tom convicto ouvi: «és profundamente espiritual ! » ???

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04/05/2007

No fundo do mar...

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Fotos da autoria de P. E. - cópia proibida...

É o mais novo. Sempre aventureiro e destemido. Estas fotos foram tiradas por ele durante mais um mergulho, desta vez, no fundo do mar, em Sesimbra... Lindas imagens!!!
«Bigada mano»

Palavra(s) salgada(s) 3

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é certa a dúvida perpétua de riquezas simbólicas

desnuda-se em ambiguidades
e fracciona-se em significações afadigadas

e a palavra reaparece
entre loucuras chegadas de longínquos destinos
sucumbe aos sons
amadurece afectuosamente e sorri
para o mundo
que a reconhece

palavra que grita ferindo silêncios torturados
impondo universos levianos
de cabelos repousados em olhares adormecidos

Palavra(s) salgada(s) 2

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com sabor a mel e sal
a palavra desliza por mim
descama almas e essências
quando

aromas de sílabas tónicas ou átonas de risos e lágrimas
soltam-se, expulsam-me, dizem-se
abrem-se, fecham-se
engolem-me

cegas embatem no casco do navio que se afunda
o mar recebe-o no seu ventre
e imagina-se mãe que,
num movimento inverso,
impede a gestação

03/05/2007

Palavra(s) salgada(s) 1

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Não sei porque escreves...

por que respiras palavras
e por que as provocas
por quem as sentes
ou por quem as apagas
risco-as e sopro-lhes
esvoaçam leves e compactas

mancham o branco esquecido
com nódoas doridas
em páginas amarelecidas
fulgurantes correm
numa libertinagem infrene
generosas oferecem ternuras
e amam intensamente
suaves sensuais submersas
sensitivas saudosas sarcásticas
elegem-te e cingem-te
excessivas ou sóbrias
fascinam-me


01/05/2007