"Chega o final de ano e a gente se projeta para o futuro de uma forma um pouco vacilante: por um lado, nosso espírito está voltado para a renovação, para investir em projetos inéditos, para sonhar alto e combater nossas carências. É como se pudéssemos, de um dia para o outro, zerar o que foi realizado e nascer de novo.
Por outro lado, temos dificuldade em dar essa zerada, porque isso significaria abrir mão de algumas coisas que foram vividas, e ninguém quer trocar uma coisa por outra, e sim acumular. O ideal seria o novo ano nos receber de portas escancaradas para que passássemos com toda nossa bagagem.
Porém, a porta não é tão escancarada assim. Não dá pra trazer tudo com você. Principalmente se você está assim tão repleto de desejos novos. Para que possamos receber o novo, é preciso deixar pra trás desejos antigos. Isso não significa que a gente não deva guardar boas lembranças, mas não dá pra se agarrar a isso como a uma âncora. A gente só pensa em ganhar, mas é preciso aprender a perder.
Foi lendo uma crônica do Contardo Calligaris, de dezembro de 2005, que me deu o estalo: como é que vou abrir espaço para novos acontecimentos e emoções na minha vida se não consigo me despedir do ano passado, do tempo passado ?
Adeus ano velho. Foi ótimo, foi péssimo, foi fácil, foi difícil, me dei bem, me machuquei, teve de tudo. As coisas boas naturalmente vão se acomodar na minha mochila e vir comigo, mas e tudo aquilo que não cabe mais na minha vida ? Faço o que com o excesso de peso ?
Algumas pessoas desejam uma nova perspectiva profissional, mas, em vez de um basta para o trabalho que já não serve, se arrastam mais um pouco e os prognósticos de novidade não se cumprem. Há os que querem parar de fumar, parar de engordar, parar de beber, mas para tudo isso terão que abrir mão de algo difícil de abandonar: o prazer que certos maus hábitos proporcionam.
E tem aquele assuntinho onipresente, as relações amorosas. A gente já não vê mais graça em sofrer, não quer se acostumar com a dor, com as repetições, com a aridez do coração, mas como virar a página depois de tudo o que foi investido, de tanta tentativa, de tanto sentimento que não foi inventado, mas que existiu de fato ? Para responder a essa questão, volto (e voltarei sempre) a uma frase do Norman Mailer: "As pessoas procuram o amor como solução para seus problemas, quando o amor é a recompensa por você ter resolvido seus problemas."
E emendo com uma citação que complementa a anterior. Do Calligaris, claro, guru e inspirador desta crônica: "Meus votos para todos: um ano novo sem medo de perder."
Martha Medeiros
Obrigada prima por teres partilhado este texto comigo! Longe, mas sempre perto!
2 comentários:
Eu é que agradeço a partilha... se não fosses tu não teria lido este magnífico texto.
Querida amiga, desejo-te um Natal muito feliz, na companhia dos que mais amas.
Beijos.
Obrigada Nilson. E tudo do melhor para ti!
Beijinhos
Enviar um comentário