30/11/2006

REpensar 1



Perguntaram ao Dalai Lama:

«O que mais te surpreende na Humanidade?»

E ele respondeu:

«Os homens... porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem dinheiro para recuperar a saúde.

E, por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem-se do presente de tal forma, que acabam por não viver nem o presente nem o futuro.

E vivem como se fossem morrer... e morrem como se nunca tivessem vivido!»

29/11/2006

(IN) autenticidades 3



Hoje não há palavras... apetece-me um bloqueio de ideias e de sensações... livre para voar em espiral pela imaginação do vazio...

Um cansaço cretino desmaia pelo meu corpo que, indolente, vagueia por aí...

Uma inércia inexaurível invade o espírito e trauteio a canção:

«Vem no fim da noite sem avisar
Dança no silêncio no teu olhar a chamar por mim
A chamar por mim…
Chega com a brisa que vem do mar
Brinca no meu corpo a desinquietar, como um arlequim,
como arlequim…
Chega quando quer e não quer saber
Nem do mal que fez ou que vai fazer, é um tanto faz…
Querer ou não querer…
Chega assim cavaleiro andante,
Louco e triunfante
Como um salteador
Pra no fim nos deixar a contas
Com as palavras tontas
Que dissemos por amor…»

28/11/2006

(IN) autenticidades 2



Foto: Wilian Aguiar

Há dias assim… é a letra duma canção, não é? Ou alguma coisa similar… Não me recordo, nem quero esforçar-me em divagar por aí à procura de sentidos e de contextos.

Tudo é tão irreal e encenado!!!

Acordei esmagada pela expectativa de mais um dia repartido entre um gabinete e uma deslocação ao Porto para uma reunião de trabalho. Espartilhada num automatismo de movimentos e de reacções, agi em conformidade com as expectativas dos outros, decidindo, ordenando, advertindo, aconselhando… A ausência de sentido conduz-me por labirintos fantasmagóricos que me impulsionam sem relutância a abrir os olhos e a olhar o céu.

Uma inquietação toma conta de mim e perfura-me, pouco a pouco, sem respostas e sem estímulos. Abandono-me às palavras e danço com elas. Uma solidão que desponta aqui e ali por entre essa multidão de seres, que interagem indiferentemente e articulam sons incompreensíveis, atira-me para a berma da linha imaginária que delineia o meu caminho sinuoso e linear, num paradoxo gélido de sentires e de olhares…

27/11/2006

(IN) autenticidades 1



E o vento levantou o véu sem pretensões nem dilações. A meio caminho estanquei, impávida e impotente, com os olhos pregados no horizonte envolto numa névoa indistinta de cores e de formas.
O mar plagiava os uivos de uma dor distante e recusada perante a margem profana e ambígua de um fim suspenso, como se de um início se tratasse.
O ar recuou domado por um impulso de jejum libidinoso e mumificou-se num suspiro escultural de eterna beleza, inextinguível, captada por efémeros instantes.
O tempo susteve-se numa indiferença paraplégica e a linfa inverteu o movimento circulatório, elevando a esperança até ao infinito.
Espero, perseverante… como se da espera urgisse a esperança.

Um sorriso pintado de vermelho



Sorri ao verificar que 100 visitantes passaram por este blog de principiante que foi concebido num impulso de mudar rotinas e multiplicar olhares.
Não há uma finalidade pré-estabelecida em colocar este ou aquele texto, esta ou aquela imagem… A forma e conteúdo dependem única e exclusivamente do estado de espírito e da disposição com que o acordar me brinda, após uma noite bem ou mal dormida.
Apesar dos meus colaboradores terem acedido gentilmente ao meu convite, o certo é que qualquer um deles tem uma vida profissional muito absorvente e, apesar da boa vontade ou condescendência face às minhas aspirações, ainda não iniciaram a sua participação activa, excepção feita ao Carlos C. com o poema «Verdade» de Carlos Drummond de Andrade.
Mas o incentivo de alguns comentários e o apoio na rectaguarda dos colaboradores, contribuem para não abandonar para já este projecto, até porque, para quem me conhece bem, dificilmente desisto!
Neste momento, o balanço que faço desta experiência salda-se por uma descoberta estimulante, dado que tem permitido navegar por outros blogs já consolidados e fontes de conhecimento, de imaginação, de criatividade.
Agradeço aos 100 visitantes que espreitaram este esboço indefinido e espontâneo, que vai circundando as linhas e as margens de uma intimidade mais ou menos exposta.

26/11/2006

Re miniscências 3

Egon Schiele


Buscar o inatingível

Fugir ao inevitável

Negar a evidência

Do despontar suave

Da semente ignorada

Que chegou com o vento

E cresceu sem licença.

O tempo fez o resto:

A semente medrou

mas não desabrochou.

O ar estéril

queimou o botão

que já brotava.

Do caule sangrou a seiva

derramou-se no solo

inconsistente e imperceptível

Foi um só e único grito

de dor atroz e aguda

que penetrou na raiz

e dizimou a última réstia de vida.

RE miniscências 2

A negação emerge subitamente

A esperança esvai-se

O amor dissolve-se.

Revolta e rigidez permanecem.

Dizer não, escrever não.

Sentir… não!

A consolação da vingança

Dilui-se no alívio da libertação

Perseguir um futuro enevoado

Indistinto e indefinido.

É avançar contra o vento

Caminhar entre as gotas de chuva.

Evitar a mágoa

E interromper definitivamente o sonho.

RE miniscências 1

A chama derrete a vela

a cera queima os dedos

os nervos, até…

a dor não doer mais!

De novo a cera envolve um corpo inerte

o coração pára de bater

o pensamento dissipa-se

e nada fica, até…

a morte não matar mais!

O sublime declina

purifica a alma

que nada é.

O exorcismo mítico

do peso vagueia

pelos séculos

e faz ruir

e regressar às origens

Mais nada é, é pó

que se desprende

percorre o universo

brilha nas estrelas

cintilantes e artificiosas

que sobrevivem ao Tempo

e arrebatam as novas gerações.

25/11/2006

RE impressões 3


Frida Kahlo El venadito, 1946


tribos pré-históricas

lançam o fogo

no caos implacável

é um bramir de forças sobrenaturais e pálidas

emergem doces carícias

na triste aparência

reencontro os deuses

louvores dos cegos

calamidades

ritmo afastado do sol

amortece a sólida mármore

terrível visão de vultos

sensíveis e apáticos

executados na guilhotina

arrepiante e libertadora

detém o tráfico de almas

RE impressões 2

filosofia mórbida

caça o ser

nos cumes dos céus

expressa as faces

dilatadas e roídas

nos extremos

da continuidade

brilha o efémero

na solidão niilista

palpita o fígado sagrado

dos resíduos nucleares

sorve o líquido

da carne dilacerada

fruto espiritual

da função exacta

implícita na latitude

da hesitação constrangedora

e póstuma:

verdade ou ilusão?

realidade ou quimera?

RE impressões 1


Foto: http://www.allposters.com/

olhares subtis

que se tocam

num ritmo lento

apetecido

irresistível

comunhão táctil

descoberta irremediável

sentir a pele

sonhar reinos

conquistados

e perdidos

querer

acima de tudo

apesar de tudo

mais que tudo

a palavra

aterra o coração

domado

domina o espírito

revolto

dizer não posso

sentir não quero

mas a palavra

existe sem dizer

o amor

impõe-se sem sentir

o jogo acaba

num fumo sem dor

sem vencido

nem vencedor.

24/11/2006

sUrPrEeNdEnTe!!!




Cliquem no seguinte link e explorem:
FRAGMENTOS

Quando nos falham as palavras... ficam os sentidos!

Sem limite de velocidade

Uma nota de humor para aliviar o fim-de-semana que está à porta!
Este transporte traz só vantagens. Senão vejamos:
É veloz e não se corre o risco de apanhar multas por excesso de velocidade !
É económico pois não necessita de combustível, de oficina, de seguro, nem paga imposto de selo nem estacionamento!
Prático pois podemos usá-lo para outros fins e tê-lo em casa, sempre à mão!
E, evidentemente, amigo do ambiente !!!
Obrigatório o uso de capacete que é escolhido segundo a imaginação de cada um! :)

Assisti: «As Mulheres da Minha Vida»

Com a meteorologia a ameaçar chuva, frio e vento: ou fico em casa… ou vou ao teatro?! Aceitei o convite para assistir à peça do autor norte-americano Neil Simon, vencedor do Prémio Pullitzer, representada pelo actor brasileiro António Fagundes…

Os conflitos interiores de um escritor manifestam-se através de monólogos, que se traduzem em associações de personagens femininas que, por sua vez, desfilam no seu imaginário como repercussão da sua turbulência emocional.

Até que ponto as mulheres conseguem afectar as mentes masculinas??? Achei o protagonista inverosímil e o tema e respectivo tratamento não me seduziram especialmente… embora seja indiscutível que o actor possua dotes naturais que fazem alguma «imbeija» a alguns desmazelados que por aí andam.

22/11/2006

Quem melhor do que o poeta para falar de...?

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.

Escrever, por exemplo: «A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os astros lá ao longe.»
O vento da noite gira no céu e canta.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu amei-a, e por vezes ela também me amou.

Em noites como esta tive-a eu nos meus braços.
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.

Ela amou-me, por vezes eu também a amava.
Como não ter amado os seus grandes olhos fixos.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não a tenho. Sentir que a perdi já.

Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.

Importa lá que o meu amor não pudesse guardá-la.
A noite está estrelada e ela não está comigo.

Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe.
A minha alma não se contenta com havê-la perdido.

Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a.
O meu coração procura-a, e ela não está comigo.

A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores.
Nós dois, os de então, já não somos os mesmos.

Já não a amo, é verdade, mas tanto que eu a amei.
Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido.

De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos.

Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda.
É tão curto o amor, tão longo o esquecimento.

Porque em noites como esta a tive nos meus braços,
a minha alma não se contenta com havê-la perdido.

Embora esta seja a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.
Pablo Neruda

PRINCÍPIOS

Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.

Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez não precisássemos de viver
tanto, quando só o que é preciso é saber
que temos de viver.

Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.

Nuno Júdice

Visibilidade do amor para quem acredita

Egon Schiele Die Umarmung (Die Liebenden) 1917


Vibrátil, fina, perfumada e clara,

Ondula a aragem que o amor provoca.

Longe, respira a vida. Aqui, o sonho.

Tudo é infância de águas e colinas

Na manhã dos teus olhos.

E voos, de mãos dadas,

E cantos, cantos de infinito amor,

Nos galhos, nas correntes e nas sombras veladas.

Envolvem-se de nuvem nosso abraço.

Vibrátil, fina, perfumada e clara,

Ondula a aragem. Fadas e duendes

Agitam instrumentos na folhagem…

Vibrátil, fina, imperceptível, fluida,

Orquestra ao longe, no fundo dos sentidos:

Dedos de flores ondeiam sobre a pele

De céus indefinidos…

Cantam mistérios bocas fascinadas.

Abrem corolas, sobre a luz que as toca.

Vibrátil, fina, perfumada e clara,

Ondula a aragem que o amor provoca.

Natércia Freire

20/11/2006

(IN)visibilidade(S) 2

Uma invisibilidade reconfortante invadiu-a, deixando-a prostrada na velha poltrona forrada a veludo suave e tingido de vermelho quente.

A opacidade permanente de objectos humanos à sua volta desvaneceu-se gradualmente…

Livre para voar pelo universo rumo ao sol… hermética a calores rasgados por pássaros migradores que, se detinham por segundos nessa corrente de horas que dançavam, loucas, à volta dos seus cabelos.

Um autismo ardente de forças sublimes e sorridentes cobriu os seus ombros e embalou-a ao som de uma melopeia surda de ritmos e de vozes.

A luz intensa que iluminou o seu olhar brilhante e lancinante, eternizou a sua cegueira.

Subitamente, uma amnésia percorreu o labirinto de memórias longínquas e próximas… corrompeu-a até à sua essência oculta numa profundidade doce e serena.

Sorriu, porque o sorriso permaneceu. Livre!

(IN)visibilidade(S) 1

Uma equipa de cientistas norte-americanos e ingleses conseguiram fazer com que um objecto desaparecesse, coberto pelo que chamam de "manto de invisibilidade".
O estudo, revelado na Science, explica o que os cientistas denominam de ‘ilusionismo científico’, sugerindo que este é um pequeno passo para chegar à invisibilidade. (…)

No trabalho publicado, os cientistas indicam que fabricaram o "manto de invisibilidade" com o que chamam de "metamateriais", dispostos de forma concêntrica, com propriedades electromagnéticas específicas. Esses materiais são compostos de metal, cerâmica, teflon e fibra.

O manto foi desenhado mediante especificações teóricas electromagnéticas determinadas pelo físico John Pendry, do Colégio Imperial de Londres, com a colaboração de cientistas dos EUA. Segundo David Smith, outro engenheiro da Universidade de Duke, este manto reduz o reflexo da luz sobre o objecto, e elimina a sombra que poderia levar à sua percepção. O investigador explica que ao incorporar materiais com propriedades complexas, o manto permite esconder um volume ao abrir um espaço livre, quando é olhado de fora.(…)

Embora esta tenha sido uma das estruturas de "metamateriais" mais elaborada feita até hoje, com potencial para ocultar objectos de qualquer tamanho ou propriedade, os cientistas reconhecem que sua experiência não foi perfeita, já que produziu uma leve sombra do objecto.

Torna-se assim necessário “melhorar sua estrutura", ressaltou Smith, acrescentando que “agora sabemos como fabricar um melhor e o próximo passo será um tridimensional”.

http://ciberia.aeiou.pt/?st=5621

19/11/2006

«Sei lá»… «não há coincidências»!!!



Com incidências ou não… passei os olhos e parei por ali…num exercício mecânico de leitura mais para ocupar o tempo, esse ditador, do que propriamente para captar o sentido das palavras… sentido??? Falta dele, isso sim!!! E valha-nos, pelo menos, o de humor para compensar a ausência do semântico!

Não, recuso-me a maldizer… quero apenas sorrir… deixem-me sorrir com um rasgo de boa disposição provocado pela apreensão do conteúdo de vital importância!!! Para quem?! Ai, fiquei muito mais «ricaaaaaaaaa», embora ainda longe dos calcanhares dessa escritora (???) que foi ao circo e viu palhaços… e não gostou!!!

Como, aliás, remata na sua crónica «Palhaços Ricos» no JN:

«Não gosto de palhaços, nunca gostei, já em pequena fugia deles e chorava sempre que aparecia um numa festa, por isso "enganei-me" a dar-lhe o número do meu telemóvel e tão cedo não volto ao bar da moda, porque daqui a uns meses ele deixa de lá ir e, com um bocado de sorte, nunca mais me cruzo com aquele palhaço rico que usa rímel e vai à manicura.»

A arte circense não é para todos… E lá que há palhaços, há… com coincidências ou não!

Que fique registado que nunca li nenhuma obra desta senhora, mas nem agora fiquei curiosa… quem sabe um dia… se esta frase vier a ser um título da sua autoria.

Alguns exemplos de riqueza linguística:

«Eu conheci o gajo…»

«…dá sempre a volta à cabeça aos gajos…»

«O gajo aquela pinta dos tipos…»

«…rímel como nós, as gajas, usamos.»

«…o gajo serviu-me champanhe do bom…»

«E o gajo arqueou as sobrancelhas…»

«Há muitos gajos destes…»

«…gajos armados em qualquer coisa…»


Ah, é verdade, não se esqueçam de oferecer (bons) livros nesta época natalícia!

E, já agora, quem pode perder um bom espectáculo de circo?!

ACREDITAR



acreditar
era indispensável acreditar
dois corpos numa descoberta
inédita

sem palavras
sem limites
sem refúgios

acreditar
único
original
exclusivo

momentos partilhados
perdidos
numa cobardia recíproca
de seres terrenos
e
afinal
subjugados à normalidade
que perpassa paredes
e
séculos

Isto não é foto-montagem...

Recebi por mail com a indicação de tal «brinquedo» estar estacionado em frente ao Colombo...

A propósito do filme «O Perfume - História de um Assassino»


Confesso que não li o livro… a razão reside no facto de ser um «daqueles» que se mantém durante algumas semanas no top! Desconfio sempre… E, de quando em vez, engano-me!

A escolha do filme foi ao acaso: o nome do realizador Tom Tykwer não me é familiar, bem como o de Ben Whishaw, o protagonista. Os nomes de Alan Rickman e Dustin Hoffman também não me seduzem particularmente.

Talvez a minha preferência desde sempre por perfumes… odores… aromas… tivesse tido alguma influência.

Sem entrar em comentários profundos, gostei do filme e suscitou-me a curiosidade de ler o romance.

Grenouille, um ser despojado de qualquer dimensão moral e social, o que põe em causa a sua própria natureza humana, personifica motivações básicas que são inerentes a todo o ser humano: a necessidade imperiosa de afirmação, a busca permanente de si próprio e o poder sobre os outros.

A utopia obsessiva em criar um perfume ideal capaz de provocar o «amor», perseguida por Grenouille, converge num final surrealista em que vence o erotismo. Absorvidos pelo objectivo que norteia a sua actuação e que o obriga a tornar-se num assassino, acabamos por conceder-lhe a nossa absolvição, porque, entre o horror que nos inflige a morte das vítimas e o ideal supremo que quer alcançar, simpatizamos mais com o estado animal, puro e original, livres de preconceitos e juízos de valor.

Comunicar é preciso...

NAVEGAR É PRECISO

Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
"Navegar é preciso; viver não é preciso".

Quero para mim o espírito desta frase,
transformada a forma para a casar como eu sou:

Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue
o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir
para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.

Fernando Pessoa in Obra Poética

Como anda a nossa auto-estima patriótica?!

Portugal vale a pena

"Eu conheço um país que tem uma das mais baixas taxas de mortalidade de recém-nascidos do mundo, melhor que a média da União Europeia.

Eu conheço um país onde tem sede uma empresa que é líder mundial de tecnologia de transformadores. Mas onde outra é líder mundial na produção de feltros para chapéus.
Eu conheço um país que tem uma empresa que inventa jogos para telemóveis e os vende para mais de meia centena de mercados. E que tem também outra empresa que concebeu um sistema através do qual você pode escolher, pelo seu telemóvel, a sala de cinema onde quer ir, o filme que quer ver e a cadeira onde se quer sentar.

Eu conheço um país que inventou um sistema biométrico de pagamentos nas bombas de gasolina e uma bilha de gás muito leve que já ganhou vários prémios internacionais. E que tem um dos melhores sistemas de Multibanco a nível mundial, onde se fazem operações que não é possível fazer na Alemanha, Inglaterra ou Estados Unidos. Que fez mesmo uma revolução no sistema financeiro e tem as melhores agências bancárias da Europa (três bancos nos cinco primeiros).

Eu conheço um país que está avançadíssimo na investigação da produção de energia através das ondas do mar. E que tem uma empresa que analisa o ADN de plantas e animais e envia os resultados para os clientes de toda a Europa por via informática. Eu conheço um país que tem um conjunto de empresas que desenvolveram sistemas de gestão inovadores de clientes e de stocks, dirigidos a pequenas e médias empresas.

Eu conheço um país que conta com várias empresas a trabalhar para a NASA ou para outros clientes internacionais com o mesmo grau de exigência. Ou que desenvolveu um sistema muito cómodo de passar nas portagens das auto-estradas . Ou que vai lançar um medicamento anti-epiléptico no mercado mundial. Ou que é líder mundial na produção de rolhas de cortiça. Ou que produz um vinho que "bateu" em duas provas vários dos melhores vinhos espanhóis. E que conta já com um núcleo de várias empresas a trabalhar para a Agência Espacial Europeia. Ou que inventou e desenvolveu o melhor sistema mundial de pagamentos de cartões pré-pagos para telemóveis. E que está a construir ou já construiu um conjunto de projectos hoteleiros de excelente qualidade um pouco por todo o mundo.

O leitor, possivelmente, não reconhece neste País aquele em que vive - Portugal. Mas é verdade. Tudo o que leu acima foi feito por empresas fundadas por portugueses, desenvolvidas por portugueses, dirigidas por portugueses, com sede em Portugal, que funcionam com técnicos e trabalhadores portugueses. Chamam -se, por ordem, Efacec, Fepsa, Ydreams, Mobycomp, GALP, SIBS, BPI, BCP, Totta, BES, CGD, Stab Vida, Altitude Software, Primavera Software, Critical Software, Out Systems, WeDo, Brisa, Bial, Grupo Amorim, Quinta do Monte d'Oiro, Activespace Technologies, Deimos Engenharia, Lusospace, Skysoft, Space Services.

E, obviamente, Portugal Telecom Inovação. Mas também dos grupos Pestana, Vila Galé, Porto Bay, BES Turismo e Amorim Turismo.

E depois há ainda grandes empresas multinacionais instaladas no País, mas dirigidas por portugueses, trabalhando com técnicos portugueses, que há anos e anos obtêm grande sucesso junto das casas mãe, como a Siemens Portugal, Bosch, Vulcano, Alcatel, BP Portugal, McDonalds (que desenvolveu em Portugal um sistema em tempo real que permite saber quantas refeições e de que tipo são vendidas em cada estabelecimento da cadeia norte-americana).

É este o País em que também vivemos.

É este o País de sucesso que convive com o País estatisticamente sempre na cauda da Europa, sempre com péssimos índices na educação, e com problemas na saúde, no ambiente, etc.

Mas nós só falamos do País que está mal.

Daquele que não acompanhou o progresso. Do que se atrasou em relação à média europeia.

Está na altura de olharmos para o que de muito bom temos feito. De nos orgulharmos disso. De mostrarmos ao mundo os nossos sucessos - e não invariavelmente o que não corre bem, acompanhado por uma fotografia de uma velhinha vestida de preto, puxando pela arreata um burro que, por sua vez, puxa uma carroça cheia de palha.

E ao mostrarmos ao mundo os nossos sucessos, não só futebolísticos, colocamo- nos também na situação de levar muitos outros portugueses a tentarem replicar o que de bom se tem feito.

Porque, na verdade, se os maus exemplos são imitados, porque não hão-de os bons serem também seguidos?"


(Nicolau Santos, Director-adjunto do Jornal Expresso)

05/11/2006

Marcas do tempo


















L'Intelligence Emotionnelle en 10 points


"On ne voit bien qu'avec le COEUR,

l'essentiel est invisible pour les yeux"

(A. de St Exupéry - "le Petit Prince" 1942)

1 - Aborder la Vie en adoptant de nouveaux points de vue pour enrichir notre compréhension. Se ramasser au centre de Soi Même, symboliquement en son coeur, point de départ de la trajectoire en direction de ses propres buts.

2 - Adopter un langage avec des mots choisis et précis. Parler avec des mots justes en étant capable de comprendre l'autre et de se mettre à sa place.

3 - Prendre conscience de l'importance d'une bonne communication, basée sur la qualité de présence de l'Etre, la compréhension et l'empathie. Etre capable d'éclaircir les malentendus pour faire disparaître les conflits.

4 - Avoir une estime de Soi suffisante en conservant son intégrité dans n'importe quelle circonstance.

5 - Créer un espace toujours disponible dans son mental et dans son esprit pour être à l'écoute de l'environnement à chaque moment, ici et maintenant.

6 - S'adapter instantanément aux nouvelles situations, répondant avec le coeur et les intuitions plutôt que réactivement.

7 - Etre conscient de sa propre Histoire en intégrant la mémoire de son vécu, néttoyé de tous les systèmes de croyances et d'empreintes successives accumulés dans notre vie.

8 - Utiliser tout son potentiel d'énergie pour le futur dans un but d'évolution.

9 - Considérer les émotions comme des ondes en mouvement capables de traverser les espaces. Les libérer en les exprimant sans gêne ni retenue dans des situations appropriées.

10 - Se réconcilier avec la mémoire émotionnelle des situations délicates du passé.

Isto dá que pensar...


Second Life tem continente e ilhas. Os "habitantes" compram terras, fazem festas e negócios reais
«Um segundo corpo uma segunda vida

Manuel Molinos textos

Falar de realidade virtual provoca um sorriso ou uma expressão menos crédula. Mas quando dizemos que estamos a ganhar dinheiro num cenário a três dimensões, contratar trabalhadores e colaborar com grandes empresas, o caso muda de figura. Há quem tenha uma "segunda vida" tão importante como a primeira e faça do mundo virtual a sua "casa". Afinal o universo da trilogia dos filmes "Matrix" existe. Chama-se Second Life (SL).

O projecto comercial da empresa californiana Linden Lab está a provocar uma nova dimensão na web. Mais de um milhão de utilizadores "comuns" está a viver no SL (www.secondlife.com), uma plataforma sedeada na Net que já cativou a atenção de grandes empresas internacionais.

Tudo é possível neste universo habitado por "avatares" (representações animadas das nossas pessoas). (...)»

in Jornal de Notícias, 5 de Novembro de 2006

Para quem ficou curioso:
secondlife

02/11/2006

"O colega do lado"

por Maria João Lopo de Carvalho

«Gramamos a família porque a hereditariedade nos impõe, gramamos o marido (ou a mulher) porque o escolhemos de livre vontade, mas gramamos os colegas de trabalho porque nos calham na rifa e temos de levar com eles em cima, a bem ou a mal, na melhor das hipóteses, oito horas por dia.
Ou seja: a família, quando muito, aos domingos e feriados; o marido e os filhos, duas, três horas por dia, no máximo (metade das quais a ver televisão ou a partilhar tarefas domésticas); e os outros, para os quais não fomos ouvidos nem achados, dispõem de mais tempo e de mais espaço do que toda a nossa vida somada. É com eles que rimos, choramos, que nos irritamos, que amuamos, que lixamos ou somos lixados, que vamos à bica e às compras, é a eles que avaliamos, que ajudamos, são eles os nossos carrascos e cúmplices, os nossos amigos ou, pior, os nossos principais inimigos. É no trabalho, acho eu, que revelamos as nossas grandes capacidades e virtudes, mas também, e como há tempo para tudo, o pior que o ser humano tem: a inveja, o rancor, a gula (roubo todas as caixas de chocolates onde os meus olhos vão parar), a vaidade, a intriga, o orgulho, a luxúria (enfim, todos sabem como e porquê.)
"Ai, você hoje está linda...",
"Acha dr?",
"Não acho, tenho a certeza!
O ambiente de trabalho é assim, muitas vezes, uma impiedosa arena do circo romano onde se mata quem é fraco, sobrevive quem é forte. É esta a tragédia da questão. Competitividade e matança são armas letais de significado idêntico - desafie-se o poder! Mas como perder ninguém quer, ligamos a competição à ambição (a longo prazo) e à ganância (a curto prazo), tudo em circuito fechado, para que a via-sacra da matança seja forte demais e excitante demais para a conseguirmos abafar. (...)

Há sempre um gajo porreiro em que nos escudamos e que, de facto, não nos quer tramar às primeiras; um gajo que tem dias e que ora amanteiga para direita, ora amanteiga para a esquerda - é o gajo que quando a coisa corre bem foi ele próprio que a fez (é "muita bom"), quando corre mal, fomos nós, pobres inexperientes e ele até se fartou de nos avisar, infelizmente não acreditámos no seu teatro.
Adoro a tribo dos manteigueiros frenéticos: aqueles que só saem depois do chefe nem que fiquem a jogar paciências no computador, que nos desfazem em strogonof pelas costas, que controlam as nossas entradas e saídas de cena, bichanam com os seus superiores e ajustam contas com as secretárias e o pessoal, a quem com tanta alma chamam "menor", baralhando sem pudor humilhação com humildade. Prefiro o folclore dos que gritam como ovelha a ser degolada mas que depois se redimem ao acrescentarem uns parágrafos triunfais na "porra" do dossiê.

Nós, os portugueses, adoramos reunir. Podemos não fazer a ponta de um corno, mas reunir tem de ser. Basta reunir e já está! Não é nunca o ponto de partida, é sempre o ponto de chegada. E antes de reunir gostam de planear a estratégia para tramar o parceiro. Pode não haver estratégia para mais nada, mas para tramar o colega do lado aqui vai disto.

Agressividade quanto baste é a metodologia (odeio esta palavra) para chegar ao poder. Todos conhecem a cartilha, a cru ou disfarçada de fada boa.

Em suma, os portugueses acham que para serem melhores têm de arranjar alguém para mau da fita, é a teoria dos vasos comunicantes em todo o seu esplendor.

É com "vasos" destes - que à partida não são nem amigos, nem filhos, nem marido, nem sequer os escolhemos num menu - que temos de partilhar o cheiro, a voz, e o génio; das ramelas, à barba por fazer; das malhas na meia ao rímel esborratado, todas as horas, todos os dias, todos os anos.
É tudo uma questão de "ambiente" no trabalho!»

PARA GENTE DE CULTURA E AMANTE DA LINGUA PORTUGUESA

«Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador.
Um substantivo masculino, com aspecto plural e alguns anos bem vividos pelas preposições da vida.
O artigo, era bem definido, feminino, singular. Era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal.
Era ingénua, silábica, um pouco átona, um pouco ao contrário dele, que era um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanático por leituras e filmes ortográficos.
O substantivo até gostou daquela situação; os dois, sozinhos, naquele lugar sem ninguém a ver nem ouvir. E sem perder a oportunidade, começou a insinuar-se, a perguntar, a conversar.
O artigo feminino deixou as reticências de lado e permitiu-lhe esse pequeno índice.
De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro.
Óptimo, pensou o substantivo; mais um bom motivo para provocar alguns sinónimos.
Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeçou a movimentar-se. Só que em vez de descer, sobe e pára exactamente no andar do substantivo.
Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela no seu aposento.
Ligou o fonema e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, suave e relaxante. Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram a conversar, sentados num vocativo, quando ele recomeçou a insinuar-se.
Ela foi deixando, ele foi usando o seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo.
Todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo directo.
Começaram a aproximar-se, ela tremendo de vocabulário e ele sentindo o seu ditongo crescente. Abraçaram-se, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples, passaria entre os dois.
Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula.
Ele não perdeu o ritmo e sugeriu-lhe que ela lhe soletrasse no seu apóstrofo.
É claro que ela se deixou levar por essas palavras, pois estava totalmente oxítona às vontades dele e foram para o comum de dois géneros.
Ela, totalmente voz passiva. Ele, completamente voz activa.
Entre beijos, carícias, parónimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais. Ficaram uns minutos nessa próclise e ele, com todo o seu predicativo do objecto, tomava a iniciativa.
Estavam assim, na posição de primeira e segunda pessoas do singular.
Ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular. Nisto a porta abriu-se repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício.
Ele tinha percebido tudo e entrou logo a dar conjunções e adjectivos aos dois, os quais se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas, ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tónica, ou melhor, subtónica, o verbo auxiliar logo diminuiu os seus advérbios e declarou a sua vontade de se tornar particípio na história.
Os dois olharam-se e viram que isso era preferível, a uma metáfora por todo o edifício.
Que loucura, meu Deus. Aquilo não era nem comparativo. Era um superlativo absoluto.
Foi-se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado aos seus objectos.
Foi-se chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo e propondo claramente uma mesóclise-a-trois.
Só que, as condições eram estas. Enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria no gerúndio do substantivo e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.
O substantivo, vendo que poderia transformar-se num artigo indefinido depois dessa situação e pensando no seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história.
Agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, atirou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva.»

"Redacção" feita por uma aluna de Letras,

que obteve a vitória num concurso

interno promovido pelo professor

da cadeira de Gramática Portuguesa

Descer à Terra....

Ao fim de meia hora, surgiu finalmente um espaço para estacionar... Ligeira, dirigi-me aos serviços e retirei a senha... Aguardei a minha vez observando o ar impaciente das pessoas, lendo os cartazes de publicidade colados nas paredes - Simplex... sorri -, e sempre atenta ao sinal sonoro que anunciava o número de chamada e o respectivo balcão de atendimento. Cerca de uma hora depois, lá consegui vislumbrar o meu número no écran de uma das televisões colocadas a dois metros e tal do chão, o que constitui um verdadeiro teste à visão e ficamos sempre a pensar que a nossa miopia se agravou e que vamos usufruir das vantagens da idade naquela óptica dos anúncios televisivos...
Aproximo-me e uma senhora com ar circunspecto atende-me... Lá digo ao que vou: «Preciso de uma declaração que comprove que o meu filho não está incrito na segurança social...» E, para grande surpresa minha, entregam-me um impresso para preencher e com dados de que não dispunha nesse momento! Perguntei ingenuamente: «Não basta inserir o nome na base de dados?»
Uns olhos perpelexos fitaram-me... mas ainda ironizei: «E para entregar tenho que retirar nova senha da próxima vez?» bem... os olhos baixaram indiciando assentimento... Achei que não devia massacrar mais a senhora que apenas representava essa máquina abstracta a que chamamos Estado... mas ela ainda acrescentou: «depois segue pelo correio»...
Pelo menos fiquei a saber que os correios funcionam bem... até ver!

Amar e Sentir (*) - ("Don't explain)

Não, não me expliques
a sucessão dos tempos
e o porquê de os dias serem breves.
Conta-me antes em segredo
todos os segundos longos
em que as nossas mãos se entrelaçaram
e os nossos corações bateram juntos,
como se a Eternidade fosse assim
o estarmos um no outro
absortos e isentos
de tudo o que há para lá de nós.

Não me expliques
as grandes migrações dos animais
a beleza breve das borboletas
a fala das baleias
ou a serena inteligência dos golfinhos.
Porque tudo o que me interessa
está aqui,
no espaço imenso
que separa os nossos lábios quentes.

Quero que me digas
que nada sabes de semântica, filosofia
ou tragédias gregas,
e que tudo o que tu és
se resume ao que nós somos
mesmo que consumidos na fogueira roxa
dos nossos exteriores inúteis.

Quero que me mostres
tudo o que mais amas
nas mais simples coisas e nas antigas artes
para que os dois façamos, juntos
o inventário curto desses adereços gastos
com que a nossa peça sobe ao palco.
E assim recriarmos em nós
num egoísmo imenso e único dos dois,
um mundo novo e pequeno
feito nosso sonho de grandeza sábia.

Faz por ignorar em ti,
tudo o que sabes
sobre as bíblicas origens do mundo,
o big-bang,
e a expansão contínua
do nosso Universo encolhido.
Tudo não passa de espasmos neuronais
de quem não ama o que está perto
e que consome as suas seivas
a apalpar o que não sente.
Ninguém pode amar o Cosmos.
Ninguém pode amar o que não sente.
E nada se compara ao Universo imenso
que somos tu e eu.
E repara que nele cabe
tudo o que há para descobrir,
ainda que nada saibamos
do seu início ou fim,
e só os dias de hoje sejam nossos.




Não quero que me expliques nada mais
sobre o papel do Estado-Providência
na cidadania
e na leveza da justiça vã
que se esgota às mãos dos pesados homens
que nos regem.
O único direito que reconheço
como válido e suficiente,
é o direito ao Amor,
a amar e ser amado.

Eis o que nos resta
sem descanso nem cansaço, acumular,
por cima de todas as inutilidades
que somamos,
nestes dias tristes de longas noites
que antecedem o Natal cantado
de pescoços tesos e gargantas secas.

Diz-me isso sim,
porque me interessa viajar
e sair deste berço azul que me foi quente
para sentir as luas e o sol diferente
que pousam perto dos olhares amenos
daqueles que por lá nos acham estranhos
mesmo sem saber porque o somos.
E mais ainda, torna omisso em mim
tudo o que não quero ser
ou o que sou por acidente,
e a tatuagem gorda e ampliada
do meu guru de infância, rejeitado.
Tudo o mais, para além de ti
É o que não quero.


Não me expliques porque há portas e janelas.
Abre as portas que fechei por distracção.
Fecha as janelas que abri por lassidão.
Rasga-me os horizontes
dissipa-me os nevoeiros
agita-me as águas paradas
refresca-me as areias mortas.

Os cegos só querem ver
porque isso é tudo o que lhes falta
para além do pouco que lhes resta.
Não têm precisão
de explicações nem teorias
sobre as razões porque não vêem
ou passaram a ver.
Tudo o que precisamos
é de amar e sentir.
Não de razões para amar e sentir.
Deixemos essas coisas fúteis
para os cegos do espírito
que não podem amar e sentir.

E mesmo desses nada restará de bom,
porque tudo o que de bom resta
foi feito por quem amou e sentiu
profundamente.


(*) Inspirado no título de uma canção (“Don´t explain”) de Billy Holiday, que amou e sentiu como ninguém


António Pinheiro